*A
ética do jeitinho!*
A
negação tanto de direitos quanto de serviços públicos por parte dos governantes
deve-se a uma espécie de miopia social comum aos sucessivos gestores de
qualquer esfera pública que pensam que ao fazer propaganda ou exibir dados
através de números conseguem convencer o povo de que estão fazendo uma boa
administração.
Esta cega convicção não chega a ser abalada nem mesmo quando a insatisfação em
face do atendimento precário nas áreas de segurança, transporte, educação e
saúde seja manifestada pela própria povo e também por um segmento
de servidores públicos diante da falta de recursos para executar seus trabalhos
e, sobretudo, em face do descumprimento das leis, notadamente por prefeitos;
tais como data-base, adicionais de insalubridade, desativação de postos de
serviço, além de alterações em algumas leis que referendam conquistas
anteriores das mais diversas categorias que atuam no serviço público.
Não podemos esquecer, todavia, que o contumaz descaso, em particular dos
prefeitos, pela coisa pública não é por culpa exclusiva dos mesmos. A população
e, principalmente, muitos servidores, também contribuem de maneira efetiva para
que este desolador cenário de pobreza, de criminalidade e de insegurança
prevaleça, ao adotar uma ética tradicional que tem por princípio a honestidade
e o cumprimento do dever, mas, que, paralelamente, coexista com outra ética da
malandragem, a qual tem por base, ou modelo, a valorização de uma astúcia
que sempre visa levar vantagem pessoal em detrimento do bem-comum.
Dessa forma, o mesmo indivíduo que, com justa razão, cobra transparência e
honradez dos políticos, não enxerga, ou finge não enxergar, como falta de ética
a sua própria conduta quando faz uso do expediente do jeitinho ou da
malandragem para resolver seus problemas cotidianos.
No Brasil de hoje em dia ser esperto e sempre levar vantagem se converteu em
uma estranha norma e devido ao alto grau de banalização por meio da jeitosa
esperteza a própria transgressão se transformou em uma referência de como as
pessoas devem ser.
É no antro desse "comportamento geral", cada vez mais na moda, que
ocorre a redução da atividade política à simples administração dos interesses
privados, entenda-se! "dos que são do grupo" causando, o desaparecimento
da esfera pública na qual há luta pelo bem comum e pelo coletivo e onde, enfim,
o sindicato é entendido pelos seus afiliados como instrumento crucial para
reivindicar e exigir o cumprimento das leis e não uma imoral entidade à mercê
dos interesses individuais e mesquinhos de facções políticas partidárias que
quando estão no poder o tratam como a "mosca na sopa" enxergando seus
diretores como baderneiros, ou no mínimo, como otários.
Isso se dá porque, ao trocar a esfera pública pela privada no exercício de
cargos de confiança, muitos servidores, agora "amiguinhos do
rei", negam que o representante eleito pelo povo deva cuidar dos
negócios públicos visando à promoção do bem comum dos representados, mas,
sim, que, em nome da " ideologia do ter", utilizem o mandato
legitimado pelo voto popular para obrigar seus eleitores a simplesmente
obedecer, desde que "não se vá" o favor-e-cimento...afinal, "se
a farinha é pouca..."
O único problema dessa nova "elite" malandra, levantadora de bandeira
do “Partido do Interesse Próprio” e dos amantes da subvenção (subsídios
concedidos pelos poderes públicos), é que ela demonstra toda a fragilidade do
viver coletivamente atual, mesmo em um governo que se diz adepto da
reconstrução e democrático, mas que só tolera a prática democrática se
tudo girar em torno de um consenso unicista, no qual manda quem pode...
Fica a dúvida se essa malandragem que antes era justificada pela necessidade de
sobrevivência, não teria se tornado um modelo ético independentemente de
tal necessidade, trazendo, assim, à tona, o perigo da justificação de uma
corrupção generalizada juntamente com o efeito colateral do encadeamento de
diversas chagas sociais como assaltos, prostituição, assassinatos e
descartabilidade humana que tornam as condições de vida cada vez mais precárias
ou inviáveis. *Quousque tandem...*
*Por
Valter Silva*
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